sexta-feira, 30 de janeiro de 2015

Um Modelo de Atenção à Saúde da Pessoa Idosa a ser implementado

“Se todos conhecem o modelo ideal para a atenção à saúde da pessoa idosa, por que ele não é implementado?” Essa foi a pergunta de Renato Peixoto Veras que deu início à sua fala no dia 29 de janeiro, durante o Seminário Modelos de Atenção à Saúde do Idoso, realizado conjuntamente pelo Centro Internacional de Longevidade Brasil (ILC-BR) e o Centro de Estudo e Pesquisa do Envelhecimento (Cepe), com participação de experts e de um público muito interessado.

E o palestrante continuou: “A real implementação de um modelo de atenção que leve em consideração as particularidades do envelhecimento depende de uma mudança de paradigma bastante simples”. Renato Peixoto Veras é médico, Professor Associado da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ) e Diretor da Universidade Aberta da Terceira Idade (UnATI/UERJ). Segundo Veras, essas particularidades são bem conhecidas, caracterizadas por mais fragilidades, doenças crônicas e menos recursos sociais e financeiros, entre outras. “Diante de tantas adversidades, o cuidado do idoso tem que ser estruturado de forma diferente da que é destinada ao adulto. Os modelos assistenciais são do tempo em que o Brasil era um país de jovens e sua população era mais jovem.”

Para Veras, os elementos fundamentais para a proposta de um novo modelo são a melhoria e manutenção da capacidade funcional e a estabilização de doenças existentes, de modo a provocar uma guinada na prática de saúde atual, centrada na doença e no atendimento hospitalar. Um modelo de cuidado baseado na funcionalidade e no adequado gerenciamento de doenças crônicas – um modelo que requer conhecimentos sobre a saúde da pessoa idosa.

O papel da formação para um novo modelo

O aspecto do conhecimento estimulou o debate, com comentários do moderador, médico e gerontólogo, co-presidente da Aliança Global de ILCs e presidente do ILC-BR, Alexandre Kalache, sobre “a formação profissional na Saúde, que vai além do aumento do número de geriatras” e abrange a formação de todos os profissionais de saúde para atuarem no cuidado multidimensional exigido pelo processo de envelhecimento.
 A partir da esquerda: Alexandre Kalache, Leandro Reis, Renato Veras e Thelma Rezende

Sobre a contribuição do Cepe à formação na área do envelhecimento, a debatedora Thelma Battaglia Rezende informou sobre “o trabalho que começa a ser desenvolvido em 2015 para a capacitação dos Núcleos de Apoio à Saúde da Família (NASFs) com o objetivo de preparar as equipes para as especificidades da saúde do idoso”. Entre outros projetos de formação do Cepe, também mencionou os cursos para cuidadores de idosos. Thelma é médica; pesquisadora e professora na área de Saúde Pública e de Saúde da FGV e Coordenadora Geral do Cepe.

O debatedor Leandro Reis Tavares, cardiologista e Diretor de Normas e Habilitação das Operadoras da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) – onde começou sua trajetória em 2007 -, analisou que a “prática compartimentalizada vem desde a formação e acompanha os profissionais, caso não mudem o paradigma. Adotamos modelos modulares para uma vida de modelos complexos. Um exemplo é o problema da acessibilidade em hospitais e clínicas, construídos com escadas nas entradas.”

O Governo se fez presente, por meio da Secretaria de Estado de Envelhecimento Saudável e Qualidade de Vida (SEESQV), com os subsecretários Rogério J. R. Rodrigues e Elias Gabriel; e pela Secretaria Especial de Envelhecimento Saudável e Qualidade de Vida (SESQV), com os pesquisadores Helio Furtado e Alexandre Brandão.

segunda-feira, 19 de janeiro de 2015

Green Templeton College, da Universidade de Oxford, discute população idosa e mercados emergentes

Ao aumento do número de pessoas idosas no mundo corresponde a formação de um novo conjunto de demandas de produtos e serviços, políticas públicas e legislações, projetos e iniciativas – tudo voltado às especificidades da população idosa. Diante das novas demandas, o Green Templeton College - um instituto da Universidade de Oxford -, no Reino Unido, selecionou o envelhecimento como tema de 2015 para o “Simpósio de Mercados Emergentes” (Emerging Markets Symposium - EMS), que vem sendo realizado desde 2009, com o objetivo de propor soluções para os problemas mais críticos relacionados ao bem-estar humano em países emergentes.
 
O EMS reúne, a cada ano, lideranças e autoridades influentes, representantes de governos, setores público e privado e a academia. Os Simpósios anteriores abordaram Saúde (2009); Urbanização, Saúde e Segurança Humana (2011); Ensino Superior (2012); Desigualdades de Gênero (2013) e Saúde Materno-Infantil (2014).
 
Em janeiro de 2015, o Simpósio discutiu o tema “Envelhecimento em Mercados Emergentes” (The Emerging Markets Symposium: Symposium on Ageing in Emerging Markets), tendo como convidado de destaque Alexandre Kalache, co-presidente da Aliança Global de Centros Internacionais de Longevidade (International Longevity Centre Global Alliance – ILC-GA) e presidente do ILC-BR.
 
Uma revolução em andamento
 
Sob o título “O Brasil diante da Revolução da Longevidade”, a apresentação de Alexandre Kalache expôs o acelerado aumento da população idosa como desafio para que o Brasil se prepare para o crescente número de pessoas idosas e suas especificidades. Para Kalache, os países desenvolvidos primeiro se tornaram ricos e depois envelheceram, enquanto os países em desenvolvimento, ao mesmo tempo, envelhecem e enfrentam os desafios do desenvolvimento. O Brasil entre eles.
 
Kalache mostrou que entre 1950 e 2050 haverá expressiva elevação do número de pessoas idosas no mundo, com um salto de 14 milhões para 396 milhões de indivíduos com 80 anos e mais. Segundo Kalache, especificamente no Brasil, nos próximos 30 anos, “nosso país estará entre os três países de mais rápido envelhecimento no mundo, com uma população de mais de 30 milhões de idosos”.
 
A exposição de Kalache discutiu o alcance global da revolução da longevidade, desencadeada por um salto de 30 anos na expectativa de vida na segunda parte do século XX e ressaltou o fato de que foram conquistados 30 anos extras no curso de vida e não 30 anos adicionais de velhice.
 
Alexandre Kalache exemplificou: alguém nascido em 1945, quando a expectativa de vida ao nascer era de 43 anos, está em atividade hoje – contra as previsões daquela época. E referindo-se a si mesmo: “Essa pessoa participa deste Simpósio, apesar de ter se aposentado em 2007. Mudanças assim significativas só são possíveis por que passamos por uma Revolução da Longevidade.”
 
Em sua apresentação, Kalache evidenciou como pontos centrais de mudanças, que se realizem avanços na formação e no treinamento dos profissionais de saúde sobre envelhecimento e cuidado de saúde do idoso (hoje ainda estruturados para o século XX) e que se adote a perspectiva de “curso de vida”, como meio para alcançar qualidade de vida na velhice, quando se terá mais tempo para o auto-cuidado, trabalho, lazer e períodos maiores de aposentadoria.
 
Como recomendações para políticas públicas, Kalache propôs sete pontos cruciais:
1. Suporte ao cuidado familiar.
2. Políticas “amigas do idoso”, nos moldes do Guia Global de Cidades Amigas do Idoso da OMS.
3. Questões relacionadas a equidade; relações intergeracionais; gênero e desigualdades sociais.
4. Reforma do sistema Seguridade Social.
5. Eliminação da aposentadoria compulsória.
6. Abordagem segundo a perspectiva do curso de vida.
7. Educação, Educação, Educação.
 
Alexandre Kalache finalizou com um alerta sobre as pessoas idosas em países como o Brasil, onde a população jovem é cada vez menor e as pessoas idosas se tornam bens preciosos, “uma abundante fonte natural de riquezas”. E sugeriu que sejam fontes usadas com inteligência.
 
Informações adicionais sobre o evento, em inglês, são encontradas em http://ems.gtc.ox.ac.uk/ageing/press-release.html

quinta-feira, 15 de janeiro de 2015

Saúde da população idosa e Política de Humanização

A convergência da Política de Humanização do Sistema Único de Saúde - SUS (PNH/Ministério da Saúde) com a Política Nacional de Saúde da Pessoa Idosa coloca em destaque a mudança para um paradigma centrado no cuidado.
 
Integrante do Conselho Diretor do Centro Internacional de Longevidade Brasil (International Longevity Centre Brazil – ILC-BR), a médica sanitarista, Marília Cristina Prado Louvison falou à Equipe de Comunicação e Jornalismo da PNH/MS. Marília é professora da Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo e Presidente da Associação Paulista de Saúde Pública, tendo coordenado por cinco anos a área técnica de saúde da pessoa idosa da Secretaria Estadual de Saúde/SP. Hoje integra o grupo assessor da Política Nacional de Saúde da Pessoa Idosa do Ministério da Saúde.
 
Para Marília Louvison, o paradigma do Cuidado supera o modelo orientado para a cura para se concentrar na capacidade funcional da pessoa idosa. Além disso, humaniza o cuidado pelo combate ao preconceito contra pessoas idosas, ainda rotuladas segundo diversas atitudes discriminatórias. Importante componente desse processo é a formação dos profissionais de saúde para o cuidado específico do idoso, centrado no curso de vida/capacidade funcional e em estratégias de promoção da saúde. A médica ressalta a necessidade de compreensão da heterogeneidade desse grupo etário. Em sua entrevista, Marília Louvison analisa: “Somando-se a esse quadro a transição demográfica e a transição epidemiológica, amplia-se a prevalência de doenças crônicas, especialmente as cardiovasculares, endócrinas e oncológicas, que demandam cuidados ao longo de toda vida.”
 
Em contexto de transição demográfica, com menos nascimentos e número crescente de idosos, há que se conhecer mais as particularidades sociais e sanitárias das pessoas em processo de cuidado.
 

segunda-feira, 12 de janeiro de 2015

Envelhecimento e equidade intergeracional

Em vários países, cada vez mais pessoas idosas vivem por mais tempo e alteram estruturas sociais que podem afetar a equidade intergeracional, afirmou Alexandre Kalache na Conferência de Lançamento do Centro de Bioética da Universidade Chinesa de Hong Kong (Chinese University of Hong Kong – CUHK), realizada nos dias 9 e 10 de janeiro, em Hong Kong.
 
O Centro de Bioética foi criado para favorecer a compreensão da Bioética para as próximas gerações de profissionais de saúde e de cientistas biomédicos. O objetivo é atuar com as faculdades de medicina, de saúde pública, farmácia e enfermagem, para criar ferramentas pedagógicas de Bioética de alto nível. Sua missão e as diversas metas, entre outros fatores, visam alcançar os vários setores afetados por mudanças nas práticas de saúde do século XXI.
 
Alexandre Kalache, co-presidente da Aliança Global de Centros Internacionais de Longevidade (International Longevity Centre Global Alliance – ILC-GA) e presidente do ILC-BR, fez a conferência principal (Keynote Presentation) no evento sobre “Construindo habilidades de Bioética em Hong Kong: dimensões éticas para políticas de envelhecimento e genética”. Sua exposição fez parte do módulo “Desafios do envelhecimento populacional para os sistemas de saúde de cidades globais” e teve como debatedores proeminentes pesquisadores de universidades chinesas.
 
Depois de sua fala, Kalache recebeu cumprimentos entusiasmados por sua palestra, abordagem inovativa e pela inspiração que provocou.
 
Resumo da apresentação intitulada “O aumento da população idosa é uma preocupação para a equidade intergeracional?”
 
A rapidez e o contexto do envelhecimento populacional nos países emergentes diferem muito da cultura ocidental (podendo-se ou não incluir o Japão): os países desenvolvidos primeiro enriqueceram e depois envelheceram. Os países emergentes estão envelhecendo rapidamente em uma situação de desafios socioeconômicos anteriormente enfrentados por Inglaterra, Alemanha e Estados Unidos. Para o acelerado envelhecimento de sua população, os países emergentes ainda precisam se dedicar a educar os jovens, proporcionar empregos para milhões, prover teto, alimentação e proteção etc. - e de súbito envelhecem.
 
Mais do que qualquer outro país, os BRICS se confrontam com a Revolução da Longevidade como resultado da crescente expectativa de vida ao nascer e do declínio nas taxas de fertilidade.
Enquanto na China, a redução da taxa de fertilidade resultou de políticas governamentais (uma criança por família), no Brasil houve igual redução sem qualquer intervenção de políticas. Hoje, a taxa de fertilidade no Brasil é de 1,7 – quando há trinta anos atrás estava perto de 6,0. Essa mudança advém da rápida modernização e da disponibilidade de métodos contraceptivos acessíveis à maioria da população.
 
Tendo dito isso, o número médio de filhos por mulher é drasticamente diferente ao se comparar o nível de escolaridade da mãe: 3,4 para aquelas com menos de 8 anos de educação formal e 1,4 para aquelas com nível de escolaridade mais elevado.
 
Isso mostra que a sustentabilidade da economia e as oportunidades de desenvolvimento no Brasil dependem de uma significativa educação pública para as crianças mais pobres, uma vez que elas poderão ser tanto os motores quanto os obstáculos para o desenvolvimento. No contexto do envelhecimento, as crianças de hoje serão os futuros cuidadores de pessoas idosas - e não haverá bom desempenho se não tiverem educação formal adequada.
 
A experiência da Rússia mostra como a área de Saúde é frágil – poucos anos após o fim do sistema comunista, a expectativa de vida teve um acentuado declínio, de 70 para 58 anos, e só voltou a aumentar lentamente após alguns anos. O declínio foi particularmente acentuado para os homens, como resultado de excesso de bebida, fumo e violência. As dimensões de gênero são poderosas: os homens são mais expostos aos determinantes sociais de saúde e as mulheres são mais preparadas para o cuidado – ao qual se dedicam por toda a vida, ao cuidarem de suas famílias e se engajarem na vida comunitária.
 
Um bom exemplo da dupla carga de doenças é o caso da Índia. Ainda que a expectativa de vida tenha aumentado, a desigualdade social é enorme e cria uma lacuna de mais de 20 anos se comparadas a classe média e o segmento de extrema pobreza da Índia. É como se tivéssemos na Índia uma grande Bélgica (200 milhões de Indianos de classe média) e um imenso Congo (mais de um milhão de Indianos desfavorecidos).
 
Na China, a falta de políticas públicas específicas para pessoas idosas cria tensões (por exemplo, ao contrário do Brasil e da África do Sul, onde pensões não contributivas são pagas a milhões de pessoas idosas pobres por mais de duas décadas, na China essa política não existe). O ethos da compaixão filial não sobreviveria caso se tivesse na mesma família um jovem com quatro avós e inúmeros bisavós para cuidar.
 
Os governos dos países componentes dos BRICS atribuem à família a responsabilidade pelas pessoas idosas. Isso é o mesmo que dizer: as mulheres, ainda que tenham sido, corretamente, recrutadas pelo mercado de trabalho, não desistirão de seus trabalhos mesmo após o aumento crescente do número de pessoas idosas na família. A economia desses países precisa da criação de riquezas proporcionada pelas mulheres (no Brasil, 43% da economia é gerada por mulheres). Quais políticas se fazem necessárias?
 
Somente o estabelecimento de sólidas políticas de “‘Envelhecimento Ativo”, os países emergentes farão frente aos desafios da Revolução da Longevidade. O que significa que o investimento em saúde ao longo do curso de vida e as oportunidades para a educação continuada, propiciarão que as políticas públicas sejam baseadas em direitos (mais do que em “necessidades”) e irão assegurar equidade intergeracional (com foco particular em gênero).